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E afinal onde é que podia viver gente?

Há vários anos que o Bloco tem reivindicado a elaboração de uma lista dos devolutos em Lisboa, como instrumento de fiscalização para a aplicação de uma taxa agravada de IMI, a justa tolerância zero ao desperdício socialmente inaceitável na utilização do território urbano - cada fogo vazio é potencialmente uma casa para alguém ou, pelo menos, um espaço com potencial utilidade social, económica ou cultural. A lista, que veio a ser concluída pelos serviços da Câmara em 2008, permite hoje ter o conhecimento mais preciso sobre a realidade dos devolutos: são cerca de 4600 prédios num universo de 60 mil prédios registados; uma parte importante deles estão totalmente devolutos. É caso para dizer: aqui podia morar muita gente.

Dois anos depois, de acordo com a informação obtida junto da Vereadora das Finanças da CML, a taxa agravada já começou a ser aplicada. Consideramos que este é um avanço importante, apenas realizável pela actualização da lista de devolutos.
Mas ter um fogo vazio pode ser lucrativo, visto que a expectativa de um bom negócio será elemento suficiente para valorização dum imóvel vazio num fundo de investimento imobiliário. É frequente que um imóvel passe por vários proprietários – e que o seu valor seja inflacionado em cada venda – sem que isso signifique uma valorização real: a sua reabilitação; ou a sua utilização. O próprio sistema fiscal continua a favorecer a especulação - um imóvel que seja revendido antes de três anos está isento de IMT

Este é o triste panorama resultante de décadas de políticas de inércia e/ou favorecimento da especulação imobiliária.
O dinheiro que circula no sector visa essencialmente a especulação e não responder às necessidades de uma cidade envelhecida: os empreendimentos existentes estão direccionados para o sector hoteleiro, para a instalação de novos espaços comerciais ou de escritórios e quando se dirige ao mercado habitacional destina-se essencialmente à habitação de luxo. Essa é uma das razões porque é fundamental um programa de investimento público que dê uma nova dinâmica ao sector da reabilitação orientando-o para uma prioridade indiscutível: re-habitar a cidade. Lisboa não pode continuar a reboque da especulação.

Resolvemos tentar conhecer cada um destes prédios desperdiçados, procurar averiguar quem são os seus proprietários, que usos estão previstos, que projectos existem, enfim, tentar perceber o que se passa no concreto. Tentámos aqui retomar uma ideia que tem sido já experimentada em vários blogs, procurando assim contribuir para aclarar informação, apurar responsabilidades, identificar bloqueios ou projectos previstos, e desta forma contribuir para um debate esclarecido e realista sobre as políticas, as práticas e as necessidades de intervenção urgente em termos de reabilitação e habitação em Lisboa. Neste sentido, ao longo das próximas semanas apresentaremos vários exemplos de prédios devolutos em zonas centrais de Lisboa.