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O regresso da chantagem

O vice-presidente da Comissão Europeia Valdis Dombrovskis esteve em Portugal nos últimos dois dias e apenas uma coisa ficou confirmada: a Comissão Europeia não desiste de uma política de chantagem sobre os povos e quer um retorno à mais dura austeridade que foi implementada pelo governo PSD/CDS, revelando o projeto profundamente ideológico da Comissão.

A Comissão Europeia espera que o próximo Plano Nacional de Reformas seja mais “ambicioso”, porque os progressos no cumprimento das recomendações de Bruxelas do ano passado foram “limitados”. Alertam para o perigo dos desequilíbrios macroeconómicos e para as fraquezas estruturais na economia.

Ora, olhando para os resultados e dados mais recentes da economia, olhando para a descida do desemprego, olhando para a redução do défice acima do esperado contra qualquer previsão, só se pode dizer que aprofundar as políticas e reformas estruturais promovidas pela Comissão Europeia e pelo governo da direita é admitir aquilo que a União Europeia quer: esmagar os povos, empobrecer os países e mantê-los agrilhoados dívidas públicas impossíveis de pagar e procedimentos do Semestre Europeu perniciosos.

Um exemplo paradigmático do projeto ideológico por trás da Comissão Europeia é a defesa de que o valor das indemnizações por despedimento ilegal devem ser reduzidas. Diz-se que esta proposta irá incentivar as empresas a evitar o recurso a contratos a prazo. Absolutamente ultrajante e contraproducente, pois o que se estaria a fazer era a premiar o despedimento ilegal, quando temos muito trabalho a fazer na reversão da diminuição do valor de indemnização por despedimento no país.

É o admitir de que não há saída aparente para os mecanismos que foram sendo criados nas costas dos povos: depois da novela da chantagem das sanções de há alguns meses atrás, a sequela está aí a chegar. O enredo começa agora com o Procedimento por Desequilíbrios Económicos Excessivos no papel principal. Mas o restante guião é similar: independentemente dos resultados económicos, independentemente das consequências para as populações decorrentes da austeridade, nunca se sai de uma espiral de procedimentos por qualquer coisa excessiva que servirão sempre para chantagear os Estados.

Conclusão: o problema da Comissão Europeia não são os resultados económicos, não são os défices excessivos, o problema da Comissão Europeia é ideológico. O que está em causa é um projeto ideológico que vem sendo construído ao longo das últimas décadas pelas instituições europeias, criando um labirinto burocrático sem fim, em que quem cumpre ou quem não cumpre só será avaliado por critérios arbitrários de cada comissário.

Quando assim é, a resposta deve ser a de desobedecer a regras que só prejudicam os cidadãos e limitam a possibilidade de investimento público. Quando cortamos com o ciclo de austeridade e de cortes, a economia cresceu, o desemprego desceu e o défice baixou. Mas falta ir mais longe, em especial na necessidade de investimento público. E isso só acabando com o grilhão da dívida, que estrangula o crescimento, e recusar políticas de austeridade que revertem o caminho feito no último ano.